Mercado de trabalho. Que profissionais teremos amanhã? Antevisão

Abr 21, 2022

Numa atividade de ‘Pessoas para Pessoas’, como pode enfrentar o turismo o futuro próximo com uma escassez de profissionais alarmante, que pode comprometer a recuperação económica das empresas na pós-pandemia?

Ana Jacinto (Secretária-geral da AHRESP)

“É incontornável a questão da denominação das profissões na atratividade de pessoas para trabalhar nos nossos setores de atividade: não faz a conversão imediata para a atratividade da profissão, mas é algo que os jovens valorizam

“Uma situação sem precedentes nos últimos”, classificou Ana Jacinto, Secretária-geral da AHRESP. O alerta da AHRESP para este contexto de perda galopante de postos de trabalho no canal HORECA tem sido constante nos últimos dois anos, com o apelo urgente a políticas de incentivo à contratação de profissionais, para que a escassez de recursos humanos não ponha em causa a recuperação económica destes negócios, bem como a necessidade de implementar uma forte campanha de valorização e dignificação das profissões do turismo.

Urge, assim, debater e encontrar soluções para um problema estruturante de uma atividade alicerçada na componente humana: e foi neste contexto que surgiu a Conferência ‘Mercado de trabalho | Que profissionais teremos amanhã?’. A iniciativa insere-se num conjunto de eventos que a AHRESP irá promover em 2022, que visam refletir sobre os principais condicionalismos que afetam as empresas dos setores da restauração e similares e do alojamento turístico, mas também para informar e dotar os empresários de competências que lhes permitam enfrentar o futuro com confiança.

“A problemática da escassez de pessoas para trabalhar não pode ser reduzida à questão retributiva”

À margem da Conferência ‘Açores – Que turismo em 2030’, que decorreu em Angra do Heroísmo a 8 de abril, Ana Jacinto, uma das oradoras convidadas, esclareceu que “há muitos anos que a AHRESP coloca este tema na mesa. Em 2018/19, a Associação fez uma grande sessão de reflexão sobre a pouca atração que os nossos setores tinham e sobre a falta de profissionais. Concluiu-se que, se tivéssemos 40 mil profissionais disponíveis para trabalhar nos nossos setores de atividade, eles teriam entrada imediata nas empresas, tal era a dificuldade em encontrar trabalhadores”.

“O diagnóstico está feito e foram encontradas as razões para esta problemática da escassez de trabalhadores, que não são diferentes das de hoje. A tónica é colocada na dificuldade em responder a esse diagnóstico com a concretização de propostas que mitiguem a situação, e contribuam para a criação de valor. Esse é o maior desafio”

Portugal tem um problema demográfico, que se reflete na dificuldade em encontrar pessoas para trabalhar nas empresas de alojamento turístico e da restauração e similares, e que se agravou com a pandemia, devido à transferência de pessoas que trabalhavam connosco para outros setores de atividade, que não se revelaram tão inseguros. “Agora”, explica Ana Jacinto, “não querem regressar às nossas empresas porque perceberam que podem ter folgas seguidas, que podem não trabalhar à noite, que não têm de trabalhar aos feriados”. Assim, aponta a reorganização dos tempos de trabalho dos colaboradores como uma realidade, para muitos empresários intocável, a mudar: dividir equipas por dois turnos, que representa um custo imediato, pode não só ajudar a reter os profissionais, como se poupa a médio/prazo em custos de formação e turnover, que se tornam encargos pesados para as empresas, com comprometimento da qualidade.

Por isso, a responsável diz que é “redutor” reconduzir toda a problemática da falta de trabalhadores a dificuldade de encontrar profissionais para trabalhar para a questão retributiva. “Claro que os empregadores gostariam de poder pagar melhor, mas numa altura em que tivemos dois anos de pandemia, as empresas têm as suas tesourarias completamente depauperadas e particular dificuldade em implementar medidas de aumento salarial”. Ana Jacinto considera esta uma questão relevante, mas de todo única: é preciso agir em várias frentes e a prova de que não ‘O’ fator de entrave nesta realidade, é que há empresas que pagam acima da média e sentem as mesmas dificuldades e captar e reter pessoas nas suas empresas.

Neste contexto, “a redução da carga fiscal das empresas, que é altíssima nos custos laborais, seria uma medida essencial para criar um ambiente amigável para que as empresas possam apostar naquilo que têm que apostar: a componente humana. Os profissionais são um tema central, porque obviamente esta é uma atividade de Pessoas para Pessoas”, sugere.

Passo cruciais para a valorização das profissões: alterar a designação das profissões e criar expetativas de progressão na carreira

Resumindo, há que encontrar soluções, e implementá-las, para tornar este setor mais atrativo. Existe uma oferta formativa para a qualificação e capacitação que valorizam estas profissões, mas “o que é preciso é que haja pessoas que sintam vontade de entrar no nosso setor e aceder a essa oferta. E neste momento é essa a grave lacuna que vivemos”.

Por isso, há passos a dar para a valorização das profissões do turismo: “É crucial e urgente alterar questões tão simples como a designação das profissões. É um detalhe? Claro que sim, por si só não vai fazer a diferença, mas também vai fazer a diferença”, defende a Secretária-geral da AHRESP.

E aponta mais caminhos práticos para fomentar o engajamento dos colaboradores nas empresas, como criar uma expetativa de progressão de carreira, mais difícil num tecido empresarial muito micro. Para Ana Jacinto será relativamente simples as empresas pensarem noutro tipo de benefícios, como dias de férias, ou férias em outras unidades, caso as empresas disponham dessa opção. “Tudo isso são benefícios que para os nossos jovens são muito mais atrativos do que a própria

remuneração. Portanto, há muitas coisas que as empresas poderiam já estar a fazer, e não estão, talvez por falta de capacitação ou de visão, por isso compete-nos ir ajudando as empresas, apontando caminhos e soluções para mitigar as escassez de recursos para trabalhar nas empresas de alojamento e restauração”, conclui.

RESTAURAÇÃO E SIMILARES

  • 49% das empresas sentiram necessidade de contratar novos colaboradores e, destas, 90% sentiram dificuldades na contratação
  • Entre as principais dificuldades, as empresas apontam o número reduzido de candidatos (50%) e o perfil inadequado dos candidatos (38%)
  • As funções com maior dificuldade de contratação são cozinha (75%) e empregado de mesa/balcão (72%)
  • 48% das empresas de restauração assumem não ter funcionários suficientes para assegurar a melhor qualidade do serviço
  • 52% das empresas tiveram de adiar investimentos no negócio por terem dificuldades em contratar recursos humanos
  • Entre as medidas prioritárias para combater a falta de mão-de-obra no setor, as empresas destacam a promoção de campanhas de valorização e dignificação das nossas profissões, para que as mesmas se tornem mais atrativas no mercado de trabalho (26%) e a criação de um incentivo financeiro à procura ativa de emprego, para desempregados (25%)

Alojamento Turístico

  • 25% das empresas sentiram necessidade de contratar novos colaboradores e, destas, 78% sentiram dificuldades na contratação
  • Entre as principais dificuldades, as empresas apontam o número reduzido de candidatos (52%) e o perfil inadequado dos candidatos (35%)
  • As funções com maior dificuldade de contratação são limpeza (81%), cozinha (23%) e receção (22%)
  • 17% das empresas de alojamento assumem não ter funcionários suficientes para assegurar a melhor qualidade do serviço
  • 28% das empresas tiveram de adiar investimentos no negócio por terem dificuldades em contratar recursos humanos
  • Entre as medidas prioritárias para combater a falta de mão-de-obra no setor, as empresas destacam a criação de um incentivo financeiro à procura ativa de emprego, para desempregados (28%) e a promoção de campanhas de valorização e dignificação das nossas profissões, para que as mesmas se tornem mais atrativas no mercado de trabalho (26%)

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