Diário de Notícias | Opinião de Ana Jacinto “Imigrantes: sozinhos ou em casa”

Out 9, 2024

A secretária-geral da AHRESP escreve, no Diário de Notícias, sobre a evolução da imigração em Portugal e a importância crescente que assume na força de trabalho dos setores da restauração e do alojamento turístico. Reflete sobre os desafios inerentes à integração das pessoas, que escolhem o nosso país para viver e trabalhar, nas empresas e comunidades. Na semana em que se realiza o Congresso bianual da AHRESP, com o tema GESTÃO É TER O CORAÇÃO DO LADO CERTO, Ana Jacinto alerta para a necessidade de valorização "e de maior atenção para com as nossas pessoas, sejam elas imigrantes ou não: as nossas empresas devem fazer com que os seus trabalhadores se sintam em 'casa'"

A imigração, no nosso país, tem vindo em crescendo e a ganhar cada vez mais expressão. De acordo com o Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo, já da responsabilidade da AIMA, em 2023, a população estrangeira residente cresceu 33,6% face a 2022, ultrapassando o milhão, o que significa que, cerca de 10% da nossa população, é estrangeira.

E o Alojamento e a Restauração e Bebidas, não só não são alheias a esta realidade, como são “responsáveis” por dar emprego a uma boa parte destes imigrantes. Recorrendo novamente aos números, o Turismo nacional emprega 16% destes trabalhadores.

Do referido, não posso deixar de sublinhar a importância destes contribuintes líquidos para a sustentabilidade económica de Portugal, desafiando perceções comuns e incentivando políticas mais informadas.

No passado mês de setembro foram divulgados os resultados de um inquérito, pelo Observatório do Talento Migratório no Turismo, da Porto Business School, que concluiu que, perto de 40% das empresas de turismo, não têm implementado medidas formais de apoio e integração dos trabalhadores imigrantes. Um outro aspeto apontado pelo estudo é o desconhecimento, por parte de muitas organizações, das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores estrangeiros.

Por outro lado, 21,7% das empresas afirma não identificar grandes desafios na integração de trabalhadores imigrantes. Este dado pode sugerir uma subestimação dos problemas ou falta de sensibilidade por parte dos gestores em relação às necessidades dos seus trabalhadores imigrantes, mas também pode ter como causa a facilidade de integração devido ao facto da maior parte dos nossos imigrantes serem brasileiros (35%), que partilham a mesma língua, e sentem uma afinidade cultural que os faz “sentirem-se em casa”, ao contrário de outras comunidades imigrantes.

Também foi apontado que 21% dos inquiridos alegaram desconhecer as políticas salariais, o que exige um esforço maior na transparência remuneratória, registando-se, no entanto, uma equidade salarial entre nacionais e imigrantes.

Alguns dos dados não deixam de ser preocupantes, mas é também necessário perceber-se melhor o que as empresas deviam ter feito, que fosse da sua competência, e não fizeram, ou aquilo que não tiveram a capacidade para fazer, por falta de condições ou recursos. O mesmo se aplica ao Estado, e às suas políticas.

Neste momento continuo expectante para ver os resultados do ambicioso “Plano de Ação para as Migrações – Problemas, Desafios, Princípios e Ações”, que o Governo apresentou no passado mês de junho, e que toca nas várias vertentes de uma integração plena, como sejam a legalização, a formação profissional (desde logo ao nível da língua portuguesa) e a integração profissional, continuando a faltar respostas eficazes para a questão problemática da habitação.

Mas voltando às empresas. Não ignoro que existem particularidades quanto aos trabalhadores imigrantes para as quais as empresas devem estar especialmente atentas, mas o problema poderá até ser mais transversal do que se pensa, indiciando que devemos ter mais atenção para com as nossas pessoas, sejam elas imigrantes ou não. Há um lado mais humanista, mais emocional, que deve ser uma prática corrente na gestão, porque é mais fácil o sucesso acontecer em organizações onde as pessoas se sentem acolhidas, ouvidas e valorizadas.

Imigrantes ou não, as nossas empresas devem fazer com que os seus trabalhadores se sintam “em casa”.

 

FONTE: DIÁRIO DE NOTÍCIAS

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